A arte da narração - Capítulo 1

Know and Tell, de Karen Glass
Capítulo 1: The Art of Narration
● Você sabe o que é narração?
● Você já usa o método de narração em casa, nas suas aulas?
O que não é o método de narração
Como não funciona
● O resumo de um livro inteiro.
● Uma paráfrase de um trecho, de uma linha.
● Tornar o texto mais fácil, conferir se cada trecho está entendido.
● Dar opinião sobre o texto, discutir o que foi lido.
● Recontar apenas os tópicos mais importantes.
A verdade é que a narração é infinitamente mais simples do que parece. Mas, justamente por ser simples, nós achamos que falta algo, queremos enfeitar.
A narração é da natureza humana
Desde os primórdios da humanidade, pessoas se comunicam com as outras.
Nós valorizamos essas mensagens porque queremos ouvir e entender o que as pessoas do passado faziam, como viviam.
Entretanto, o que chegou até nós, o que foi mantido através do tempo, foram as palavras que mais os tocavam. Palavras que alcançavam o interesse, moldavam a vida das pessoas. Histórias preciosas foram passadas de geração para geração através da tradição oral. PODER DA LINGUAGEM.
Exemplo:
● A Ilíada e a Odisseia, na Grécia Antiga (século 8 a.C.), eram cantadas pelos aêdos (contadores de histórias e artistas) que recitavam ao toque da lira. Homero foi um. Ela foi escrita apenas no século 6 a.C.;
● No hinduísmo, na Índia (3.000 a.C.), os mantras deveriam ser perfeitamente recitados. Não eram escritos, porque se alguém lesse poderia ler errado. Se houvesse erros, uma catástrofe poderia acontecer.
● Aqui, podemos entrar no mérito do quão prejudicial é perder, reduzir a nossa linguagem;
● A manipulação da língua, a redução do vocabulário, a troca de significados (facismo, feminismo), adesão aos discursos é comprar o discurso de qualquer pessoa e ter sua consciência manipulada.
A arte de contar, dizer, repassar é natural da interação humana. Sendo assim, uma ferramenta efetiva de educação.
Você participa de uma reunião e resume para o seu chefe. A criança conta as histórias do fim de semana no acampamento. O adolescente monopoliza a mesa do café contando o filme da noite anterior. Tudo isso é narração.
Essas contações unem vivências e interações com o outro.
Nós contamos coisas porque gostamos de reviver momentos ou porque queremos permitir que a outra pessoa experiencie algo com você.
Naturalmente, falamos sobre coisas que importam para nós, queremos compartilhar o sentimento, a sensação, contamos porque nos importamos com algo.
“Pois a boca fala do que está cheio o coração.” Jesus fala no Evangelho de São Mateus e de São Lucas.
A arte da narração na Educação
O desejo de contar, compartilhar ideias, é natural do ser humano e pode possuir propósitos mais elevados ou mais rasos. Desde uma palestra até a fofoca na esquina.
Então, por que isso seria uma arte?
Quando tomamos essa atividade comum da vida humana e a colocamos como centro da educação, a narração se torna uma prática formal.
O método de narração é usado no ensino desde a Antiguidade, entre educadores medievais, renascentistas e, mais recentemente, a educadora Charlotte Mason.
As 7 Artes Liberais eram chamadas de arte, não ciência. Na Antiguidade, “ciência” é um corpo de saberes a ser adquirido. Uma arte não é um saber, é algo a ser praticado. Algo que você faz. Quando o saber se expressa pelo fazer, isso se torna uma arte. Narração se torna arte quando elevamos o uso cotidiano a uma busca com propósito.
O que antes era apenas uma contação, agora pode ser chamado de composição oral.
Composição é a arte de fazer o arranjo de fatos, pensamentos, ideias e apresentar isso através de palavras, nesse caso.
A narração é efetiva como ferramenta educacional porque não é uma habilidade construída do zero. É desenvolver e refinar uma habilidade natural, que eles já possuem.
O processo de desenvolvimento da narração
Para iniciar a prática da narração, você pode partir dos interesses da criança. Instrua seu filho a contar sobre um filme ou um incidente que ocorreu no parque. Acostume seu filho a contar os eventos com precisão, coerência, completamente, dando consequências aos fatos. Quando? O que havia acontecido antes? O que aconteceu depois? Mas, como isso foi feito? Quem estava perto nesse momento? Onde todos estavam?
Depois, você solicita que a narração seja feita a partir dos livros. Podem ser livros de leitura livre, leitura em voz alta ou livros de estudo, das disciplinas. A busca pela precisão, coerência deve ser a mesma, sempre encorajando-o a fatos mais completos.
Não interrompa, respeite. As perguntas vêm depois. Deixe que ele organize as ideias primeiro, depois você corrige, se necessário. Permita que eles se expressem.
No tempo devido, nós solicitamos a escrita das narrações. Eles aprenderão a escrever a mesma coisa que eles diriam numa narração oral. Quando isso se torna natural, ensinamos a pegar o que foi escrito e organizar em textos, redações, enfim.
Narração é a base da escrita
Quando falamos sobre o ensino formal em escolas regulares, vemos diversos métodos e ideais para ensinar composições escritas. Dentro desses métodos, muitas vezes o que sai é “Essa história é legal. Eu gostei porque é interessante”.
A narração pode substituir todas as outras iniciativas e técnicas “artificiais” para aprender composição escrita.
Quando você pergunta o que a criança se lembra de um evento, a resposta pode dar até 2 páginas escritas. Entretanto, muitas vezes ela ainda não teria capacidade de transformar as palavras em texto.
As crianças já tem um poder aflorado de contar coisas que aconteceram. Podemos gradualmente refinar essa habilidade. REFINAR! Eis o ponto mais interessante desse método. A habilidade já existe, então, apenas refinamos.
Através da narração, crianças tornam-se pensadores e escritores.
Narração é um treino de como pensar bem
Aprender a escrever é importante. Mas, a escrita não é o único objetivo educacional contemplado pela narração.
Dentro do âmbito social, a narração clara permite que você se expresse com clareza, compartilhando seus sentimentos, se comunicando com proximidade de outras pessoas.
A narração é uma ponte entre os relacionamentos. É onde se cria, constrói e fortalece as relações de cada criança com o conhecimento. A criança cria uma relação com o material que ela está narrando, essa relação se torna mais ampla e mais profunda. Aqui, desenvolvem-se habilidades de pensamento.
Quando uma criança precisa contar o que sabe, a atenção dela para o conteúdo aumenta. Ele lê, ouve ou assiste mais atentamente para que possa recontar depois.
● A criança que narra a vida de D. Pedro I, passo a passo, cria uma afinidade por ele, um relacionamento com ele. Parece que ela o conhece. Quando D. Pedro aparece em um filme, uma pintura, uma moeda, ele irá reconhecer como um velho amigo e não como um simples nome.
● Da mesma forma, uma criança que narra como vulcões são formados ou como rios cavam canais, o conteúdo não é mais do outro, mas o conhecimento se torna parte dele mesmo e da experiência dele.
Conclusão
Melhor do que uma simples maneira de interagir com pessoas da nossa vida cotidiana, a narração se torna a chave que constrói nosso relacionamento com conhecimento, desenvolve nossa habilidade de pensar e nos dá poder de organizar os pensamentos e relacioná-los efetivamente na oralidade e na escrita.
O processo de narração na educação aprofunda nosso entendimento do material lido, permitindo retê-lo como próprio.
O aprendizado não é mais puramente adquirir informação, mas relacionar o que aprendemos com o que já sabemos, assim nosso conhecimento cresce afiado e claro e relembramos melhor as coisas.
