#MaratonaPrimus - Como Planejar o Primeiro Ano do Ensino Fundamental | Live 2

Flexibilidade. Esse é o grande trunfo do homeschool. Sempre foi, não é verdade? É verdade que em geral as famílias não tiram as crianças da escola só pra buscar uma rotina flexível - afinal, os motivos costumam ser outros -, mas também é bem certo que a liberdade da educação domiciliar não se limita à seleção de materiais e livros.


Quando as crianças vão à escola, a rotina da família passa a girar em função desse acontecimento. A hora de levantar, por exemplo, é determinada pela hora de entrada e o tempo do trajeto. A vida passa a dividir-se em um "antes" e "depois" de levar ou buscar as crianças, o que pode provocar certo stress - principalmente se considerarmos que esses momentos coincidem com a hora do rush. Isso sem falar nas férias, que acontecem sempre na mesma época do ano e podem gerar um clima pesado entre colegas de trabalho que precisam todos abandonar a empresa ao mesmo tempo.


Em contrapartida, no homeschool  são os estudos que devem adequar-se ou moldar-se à rotina da família. De acordo com o dicionário Priberam da Língua Portuguesa, flexível é tudo aquilo que se dobra ou verga facilmente sem se quebrar. É o que se acomoda, que se presta; é suave, dócil e complacente. Como hoje vamos falar sobre como planejar o currículo do primeiro ano do Ensino Fundamental, nada melhor que começar falando sobre o ano letivo e como você pode dobrá-lo e acomodá-lo segundo as necessidades da sua família.


Dominando o calendário escolar


O calendário escolar não é o mestre. Você é. Ele existe para servir à sua família, e não o contrário. Para que possamos dominá-lo - e não ser dominados por ele - é preciso conhecê-lo bem, ainda que essa parte do planejamento soe um tanto quanto burocrática e pouco divertida. Você sabe quanto tempo dura um ano letivo no Brasil? A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, indica que o ano letivo corresponde ao mínimo de 200 dias letivos e 800 horas de efetivo trabalho escolar.


Isso corresponde a 40 semanas de estudo, de segunda a sexta, com no mínimo 4 horas de estudo em cada dia. Para a educação infantil e séries iniciais, você poderia incluir nesse horário atividade como ir à praça, encontrar os amigos ou fazer esportes, desde que haja um objetivo formativo por trás, como o desenvolvimento de bons hábitos ou a socialização. Voltando aos números, se considerarmos que o ano tem aproximadamente 52 semanas, isso nos dá um total de 12 semanas de férias (ufa!).


É importante saber disso e organizar o calendário escolar em função desse mínimo para fins de registro. Como o homeschooling não é ainda regulamentado no Brasil, é possível que em algum momento seja necessário apresentar uma descrição detalhada das atividades de estudo. Diante de uma visita do conselho tutelar, por exemplo, um calendário escolar e o registro das lições ajuda a demonstrar que não houve abandono intelectual.


O ritmo da família deve definir o calendário


Outra questão a levar em consideração é o fato de que muitas famílias brasileiras homeschoolers costumam seguir o modelo do ano letivo americano tradicional. O problema é que na terra do tio Sam o calendário escolar gira em torno de 36 semanas, 4 a menos do que o nosso, e isso pode trazer implicações posteriores por estar em desacordo com o mínimo de dias de estudo exigido no Brasil.


Diante disso, podemos adequar o calendário às nossas necessidades específicas, que podem não coincidir com as das outras famílias homeschoolers. Eu, por exemplo, moro em um lugar que faz bastante frio no inverno. Pra que vou querer férias em julho? É bem melhor estudar no frio e ter mais tempo livre no calor, certo? Para outras famílias essa já não será a melhor solução. O importante é observar o ritmo da família e, a partir dele, organizar o calendário.


Já vi algumas pessoas defendendo que, para elas, é importante estabelecer uma semana de estudos com apenas 4 dias letivos - de segunda a quinta, por exemplo - e deixar um dia extra para resolver pendências. Se esse é o seu caso, prepare-se para ter só duas semanas de férias! Dividindo os 200 dias do ano letivo por 4, chegamos a um número de 50 semanas de estudo e sobram só duas para descansar.


O que Charlotte Mason nos indica


Como vocês lembram, na live anterior expliquei que usaríamos como referência o método de Charlotte Mason durante a nossa #MaratonaPrimus. Vale a pena, então, entendermos como ela organizaria esses nossos 200 dias letivos. É claro que não precisamos seguir tudo a risca, uma vez que Miss Mason estava inserida em um contexto escolar com aulas de segunda a sábado - e isso não se adequaria à maioria de nós.


Mason dividia o ano em três trimestres (terms) de estudo, cada um com 12 semanas de duração. Em seu método, cada trimestre é composto de 11 semanas de instrução e uma semana de avaliações ao final. Aqui no Brasil esse modelo precisaria ser adaptado, uma vez que cobre apenas 36 das 40 semanas de estudo exigidas por lei. Uma opção para os 20 dias letivos (quatro semanas) que sobram é distribuí-los ao longo do ano em excursões, como visitas a museus, idas ao teatro e ao zoológico, ou caminhadas mais extensas para estudo da natureza.


Capriche nas férias!


Agora é com você! Abra uma ferramenta de criação de calendários escolares como o Calendarlabs ou o Canva e defina como distribuir seus trimestres e dias de excursão ao longo do ano. Lembre-se de que descansar é parte importante do processo, então capriche nas férias para renovar os ânimos e reserve tempo suficiente para planejar o próximo trimestre e refletir sobre o que que foi bem e o que não foi tão legal assim no anterior.


Tirando da conta os 200 dias letivos, sobram ainda 165 para distribuir como quiser ao longo do ano (ufa!). Inclua nessa lista todos os feriados, as viagens que você quer fazer, a chegada do bebê, a mudança de casa, enfim... todos os dias em que vocês não podem ou não querem ter aulas. Ah! E é sempre bom "prever os imprevistos", quando possível. Todos ficamos doentes ou indispostos, então é bom contar com alguns dias a mais de folga para usar quando for necessário.


Um pouco de diversão


Pois é. Eu sei que você esperava que o planejamento fosse um pouco mais divertido do que isso. Até agora não falamos de nenhum livro bonitinho e todo esse assunto parece bastante árido... O que aconteceu com toda aquela história de Beleza, Bondade e Verdade? É que só é possível progredir quando se pensa grande, só é possível avançar quando se olha longe, como já dizia Ortega y Gasset. Antes de falarmos sobre a lista de conteúdos e como organizá-los em cada dia, era preciso que tivéssemos uma compreensão clara do ano como um todo.


Mas, muito bem. Agora que já traçamos em linhas gerais o nosso ano, podemos entrar na lista de conteúdos previstos no método Charlotte Mason para o primeiro ano (ou, se preferirem, form 1b). São eles:


  1. Sagrada Escritura
  2. Matemática
  3. Português - Leitura (alfabetização), Escrita (caligrafia/cópia) e Recitação.
  4. Geografia
  5. História
  6. Língua estrangeira
  7. Ciências
  8. Música
  9. Arte
  10. Literatura
  11. Educação Física
  12. Habilidades para a vida


Um grande banquete


À primeira vista pode parecer muita coisa, mas não se engane. À segunda vista você terá certeza de que é muita coisa mesmo... E essa é a grande beleza da coisa! Charlotte Mason propunha que alimentássemos nossas crianças com uma educação que constituísse um verdadeiro banquete, repleto de pratos variados. Lembra daquela regrinha básica dos nutricionistas? "Coma um pouco de tudo" e "Deixe o prato bem colorido" funcionam perfeitamente aqui.


Essa história de "vou ensinar só Português e Matemática, mas vou ensinar com profundidade" não cola aqui não. Algumas pessoas usam o adágio "non multa sed multum" (não muitas coisas, mas muito) dos clássicos como desculpa para deixar os filhos desnutridos intelectualmente. É verdade que não devemos ser superficiais tentando abraçar o mundo, mas é preciso analisar o contexto dessa expressão.


"Multum non multa" tem seu registro por escrito em uma carta de Plínio, o Jovem, que foi governador na Bitínia, além de ser um notável orador. Plínio escreve a um amigo, aconselhando-o a selecionar com cuidado os autores que vai ler em cada assunto, porque embora tenhamos de ler muito, não devemos ler muitos livros. Se vê claramente que, em seu contexto original, este não é um apelo a limitar o número de disciplinas, mas sim a ler apenas as melhores obras dentro de cada uma. Como diria outro adágio latino, non legere sed eligere (não ler, mas escolher).


Variedade e generosidade


Diante do dilema da qualidade versus quantidade temos uma resposta clara de Charlotte Mason:

Temos de livrar-nos da noção de que para aprender bem os três R's (reading/leitura, writing/escrita e arithmetic/aritmética) ou a gramática latina, a criança deveria aprender estes e nada mais. É tão verdadeiro para as crianças quanto para nós que, quanto mais ampla a gama de interesses, mais inteligente é a apreensão de cada um (School Education, p. 209).


Sejamos generosos com nossos filhos. É bem mais fácil, barato e cômodo servir a mesa com só com arroz e feijão. Mas, não é a opção mais saudável. Ainda em sua carta, Plínio, o Jovem diz a seu amigo que assim como a terra se aprimora pela rotação de culturas, o mesmo acontece com a mente ao exercitar-se com diferentes estudos. Essa é precisamente a visão de Miss Mason quando nos orienta a organizar as matérias em uma sequência que possibilite aos alunos o uso de diferentes partes do cérebro ao longo do dia.


Estruturando bem as coisas


Por falar nisso, agora que temos a lista de matérias previstas por Miss Mason para o primeiro ano formal podemos começar a estruturar nossos dias. Sonya Shafer, do Simply Charlotte Mason, escreveu um artigo maravilhoso detalhando todo o processo de planejamento - desde a visão geral (big picture) até o dia a dia. Nesse artigo, ela aponta um dos problemas mais comuns na hora do planejamento: pular do planejamento anual direto para a rotina diária.


É necessário, primeiro planejar cada trimestre. Que livros serão lidos? Quais serão os recursos utilizados? Como você quer organizá-los ao longo dos meses? Em seu artigo, Sonya Schafer sugere que escrevamos o nome dos materiais que queremos usar em cada trimestre e em quantas partes eles se dividem (capítulos, lições, etc). Assim, teremos uma visão mais clara de como nosso ano será. Talvez estejamos "carregando muito nas tintas" em um trimestre e deixando outro com pouco conteúdo... Esse planejamento trimestral vai nos ajudar a distribuir os assuntos de forma equilibrada.


Depois do planejamento trimestral vem o semanal. Existem alguns assuntos que funcionam bem se forem feitos só uma vez por semana, como apreciação artística, música, estudo da natureza e artes. Mas, e quanto a Ciências ou História? Quantas vezes por semana devemos dedicar-nos a essas e outras matérias? Sonya nos responde:


Então, digamos que você esteja planejando o Trimestre/Term 1 e tenha três livros de História listados para esse trimestre. Digamos que haja 12 capítulos em um livro, 15 em outro e 9 no terceiro livro. Você somaria todos e obteria 36 capítulos ao todo para História. Agora, tudo o que você precisa fazer é dividir esse número total de capítulos pelo número de semanas em seu trimestre (12 semanas). A resposta seria 3. E essa resposta lhe diz que será necessário estudar História três vezes por semana (lendo um capítulo de cada vez) para completar todos os capítulos que você listou.


Agora sim! Chegou a hora de planejar a rotina diária! Depois de passar por todas essas etapas, tudo vai ficar mais fácil. Basta organizar uma sequência de estudos que permita a seu filho usar diferentes áreas do cérebro, porque isso o ajudará a ficar mais atento durante as lições. Sonya aconselha alternar uma matéria que exija alta concentração com outra mais leve; inserir uma matéria mais "mão na massa", artes ou matemática depois de outra que seja mais densa em palavras. Essa pequena técnica ajudará muito a tornar seus dias mais suaves, garante ela.


Como vocês puderam perceber, todo o nosso planejamento vai girar em torno dos livros. O problema é que hoje em dia parece difícil achar boas obras... Mas, não se preocupe. Na próxima live vamos falar sobre como escolher bons livros. Nos vemos em breve!


Programação


1. Escolhendo um caminho a seguir (Veja como foi)⠀
2. Como planejar o primeiro ano do Ensino Fundamental (
Veja como foi)
3. Escolhendo os melhores livros (
Veja como foi)
4. Um currículo de Geografia para o 1° ano (
Veja como foi)
5. Um currículo de História para o 1° ano (
Veja como foi)
6. Um currículo de Ciências para o 1° ano (23/11 - 21h30) ⠀
7. Um currículo de Literatura e Alfabetização para o 1° ano (25/11 - 21h30)⠀
8. Um currículo de Inglês para o 1° ano (30/11 - 21h30)
9. Outras áreas de estudo para o 1° ano (Arte, Música, Matemática, Religião, Educação Física e habilidades para a vida). (02/12 - 21h30)


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